terça-feira, 9 de novembro de 2010

Uma atividade diferente na escola

Projeto Pixaim nas escolas leva oficinas de trança afro e boneca negra para duas escolas,uma em Cuiabá e outra em Várzea Grande

Por Neusa Baptista



Atividade de trança afro na escola Manoel Corrêa em Várzea Grande

Ir para a escola aos finais de semana realizar atividades diferenciadas já é um costume dos estudantes de escolas públicas. No Programa Escola Aberta são oferecidas oficinas voltadas à Arte, como dança, ou profissionalizantes, como manicure.

À partir deste final de semana, alunos e comunidade vizinha de duas escolas públicas de Cuiabá e Várzea Grande puderam aprender algo diferenciado, dentro das oficinas oferecidas pelo Projeto Pixaim nas Escolas, realizado pela Central Única das Favelas de Mato Grosso (CUFA-MT). O projeto começou no último dia 18 de outubro nas escolas Bela Vista, localizada no bairro homônimo, em Cuiabá; e Manoel Corrêa de Almeida, no bairro Alameda, em Várzea Grande.



O Projeto Pixaim nas Escolas leva para os estabelecimentos de ensino a discussão sobre os padrões de beleza adotados pela sociedade, inserindo aí a valorização da estética negra.

No sábado (6) começaram as oficinas de tranças afro e de bonecas negras, ambas voltadas tanto a alunos quanto à comunidade. As oficinas acontecem aos sábados no período da manhã (8 h. ao meio dia) na escola Manoel Corrêa, e à tarde (14 h. às 18 h.) na escola Bela Vista.

Oficina de boneca negra

No primeiro dia de oficinas prática, as atividades atraíram principalmente jovens moradores das redondezas das escolas. No comando das atividades, as artesãs Helena Nascimento e Anice Chaves, e a trançadeira Tatiane Amorim, todas formadas pelo Ponto de Cultura Pixaim. Tatiane, que é moradora do bairro Sol Nascente, em Cuiabá, também é professora do Ponto de Cultura.

Aprovação

A estudante Daniele de Campos, de 13 anos, aluna da 6ª série da escola Manoel Corrêa de Almeida, participou da oficina de tranças afro, penteado que ela pretende passar a usar no dia-a-dia como uma opção de embelezamento dos cabelos. “Eu acho bonito usar trancinhas, quero aprender a fazer para fazer no dia-a-dia, nos amigos, família”. Adrieli Gomes da Silva, de 14 anos, também foi conferir a oficina. “Achei muito interessante, acho a trança um penteado bonito e pretendo seguir até o fim do curso para aprender mesmo”, animou-se ela.


As oficinas de tranças e de bonecas negras terão a duração de dois meses em cada escola. Na oficina de bonecas, alguns meninos também compareceram, quebrando o preconceito de que boneca é ‘coisa de menina’. André Augusto Lunardi de Almeida, de 14 anos, foi um deles. Filho e neto de costureiras, ele conta que já sabe usar a máquina de costura, e já faz objetos artesanais como o ‘fuxico’.

“Os meninos que não querem fazer curso de boneca são preconceituosos, isso não tem nada a ver”, comentou ele, que foi um dos últimos a deixar a oficina, pois estava concentrado na costura. Aos 12 anos, a estudante Lorenna Mirella de Almeida Avelar também vem de família ligada à costura. Sua mãe é dona de uma loja de confecções. “Achei interessante fazer bonecas porque no futuro quem sabe isso possa ser vendido, gerar renda, além de fazer para os amigos”.

Aluna da escola Manoel Corrêa apresenta o seu cabelo trançado

A divulgação das oficinas do Projeto Pixaim nas Escolas foi feita em parceria com as escolas, que mobilizaram os alunos e seus familiares. A dona de casa Josinei Maria da Silva, por exemplo, ficou sabendo da atividade por meio de uma amiga de sua filha, que participa da igreja Católica do bairro. Mãe de uma aluna da escola Manoel Corrêa de Almeida, ela foi aprender a trançar para aumentar os serviços que já oferece em sua própria casa. Josinei confecciona a chamada trança com elástico, a qual prende os cabelos com elásticos coloridos. Pelo serviço, ela chega a cobrar dos vizinhos que atende. “Há muito tempo queria fazer um curso de tranças, pois lá em casa minha irmã faz unha, faz chapinha, eu boto elastiquinho, minha sobrinha também faz unha. Gostamos de lidar com isso”.

Durante todo o dia, as oficinas do Projeto Pixaim nas Escolas levaram para os estabelecimentos de ensino, além do conteúdo prático, também a discussão teórica sobre estética negra e preconceito racial, feita por meio da divulgação do livro “Cabelo Ruim?” e de bate-papo sobre as idéias divulgadas pelo projeto.


Oficina de trança afro na escola Bela Vista em Cuiabá

Adrielly da Silva, 12 anos, aluna da 6ª série na escola Bela Vista, gostou da experiência. “Sou apaixonada por cabelos, por isso vim fazer curso de tranças. Tenho uma tia e dois tios que são cabeleireiros e sempre gostei de lidar com cabelos”.

Também alunas da 6ª série, Ana Paula Silva e Maria Milena Albuquerque, de 12 anos, participaram da oficina de bonecas negras. “O que me atraiu foi aprender a costurar, pois eu não sabia. Comecei a aprender a fazer bonecas e vou continuar até o fim do curso”, disse Ana Paula. “A boneca negra é diferente das bonecas que nós temos”, completou Milena.


As oficinas do Projeto Pixaim nas Escolas seguem até dezembro nas duas escolas. Em 2011, o Projeto vai atender a mais quatro escolas públicas de Cuiabá e Várzea Grande.

Conheça o projeto

Ser um instrumento de implementação da Lei 10.639/03 é um dos objetivos do Projeto Pixaim, que inclui várias ações, entre elas o Pixaim nas Escolas. A idéia é contribuir com os educadores para suprir a falta de material didático e paradidático para abordar o tema na escola.

Seis estabelecimentos de ensino estaduais de Cuiabá e Várzea Grande serão contempladas pelo Projeto, que conta com o patrocínio da Secretaria de Estado de Educação (Seduc): Dom José do Despraiado, Professor Rafael Rueda, Hélio Palma de Arruda e Padre Ernesto Camilo Barreto.

Oficina de boneca negra na escola Bela Vista em Cuiabá

Além das oficinas práticas de final de semana, o Pixaim nas Escolas doará kits pedagógicos exclusivos, elaborados pela CUFA-MT com base no livro “Cabelo Ruim?”, contendo exemplares do livro e as três personagens da obra em forma de bonecas de pano, um mini cenário de teatro, uma camiseta do projeto e uma bolsa. O material será doado a estudantes de 12 a 14 anos.

A Cooperativa Dom e Arte, da cidade de Dom Aquino, assina a confecção das bonecas de pano, que estão sendo feitas com base nas características de Bia, Tatá e Ritinha, num trabalho artesanal que também contribui para gerar renda para as cooperadas.

Os educadores que acompanham o projeto estão aprovando a ação, e já notam suas conseqüências na sala de aula. “Desde o primeiro dia, logo depois que os professores do Projeto Pixaim nas Escolas saíram da sala, eu percebi uma mudança no comportamento dos alunos. Aqui na sala tem o grupinho das brancas e o das negras e a partir deste projeto eles começaram a observar melhor as diferenças físicas que eles possuem. E a partir deste momento eu percebi que houve uma mescla de culturas, houve um olhar diferenciado sobre cada um.”





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